
Estendo o tapete para a prática e sento-me em silêncio, com os olhos fechados. A luz fraca induz à introspecção, processo que se intensifica à medida que a respiração torna-se mais lenta e consciente. No início a mente permanece dispersa, seguindo qualquer direção que lhe é oferecida -- os sons ao redor, memórias do dia anterior, tarefas a cumprir depois da aula. Logo a quietude do ambiente e das pessoas ao redor permeará minha mente e a prática terá início.
Tudo começa com expirações intensas e repetidas, como se tentássemos assoar o nariz. Os primeiros instantes não são exatamente agradáveis, mas logo as narinas tornam-se mais arejadas e, ao fim, o corpo desperta e a mente se ilumina.
Em seguida eu e outros alunos iniciamos a prática de posturas. A primeira consiste em permanecer em pé, com os pés bem afastados, braços estendidos e o tronco inclinado para um dos lados. Devo tentar alcançar meu pé direito com minha mão direita e estender o braço esquerdo em direção ao teto, para onde dirijo meu olhar. Todo o corpo parece se prolongar, as articulações tornam-se mais soltas e vívidas.
Executamos outras posturas, procurando tornar a respiração cada vez mais consciente. Em alguns momentos somos orientados a manter os olhos fechados, buscando observar mentalmente ("testemunhar", diz o professor) as forças internas, externas, físicas ou mentais que influenciam a composição, a sustentação e a dissolução da postura. O objetivo não é levar os pés à nuca, mas desenvolver consciência através da prática. Não importa o quê se faz, importa como se faz. É justamente isso que permite que pessoas com níveis e capacidades diferentes pratiquem o yoga juntas.
A manhã quente estimula a transpiração abundante, principalmente nas posturas que exigem mais força. O esgotamento físico sobrevém e o professor indica que é momento de descanso. Deitados no chão, com o corpo totalmente imóvel, relaxado, limitamo-nos a respirar e, novamente, a testemunhar as reações físicas e mentais. A atenção volta-se para o interior do corpo, de modo a sentir o ritmo cardíaco e respiratório e a oscilação sutil e constante dos pensamentos. Aos poucos o suor desaparece. O corpo parece aumentar de tamanho e espalhar-se pelo chão. Sinto-me cada vez mais pesado, o que é estranhamente acompanhado de uma sensação de flutuação.
Em seguida, já sentados e com olhos fechados, praticamos uma respiração bastante intensa, que prolonga a sensação de flutuação, ao mesmo tempo em que causa uma espécie de vibração interna. A partir deste momento fica mais difícil descrever o que acontece. Algumas pessoas chamam este momento da prática de meditação, mas, conforme meu professor explica depois, meditação é um termo que não abarca todos os aspectos daquilo que no yoga se chama samyama. O mais importante é permitir-se esta experiência, abdicar dos esforços físicos e mentais que naturalmente surgirão com o intuito de manter a prática alinhada, bela ou eficiente e ter a certeza de que os adjetivos só trazem tensão física e mental, totalmente dispensáveis durante samyama, prática que encerra a aula de yoga.
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Não se trata de ginástica, religião, filosofia ou doutrina -- embora o yoga tenha elementos que lembram todas estas coisas e muitas outras. Yoga é um dos mais antigos sistemas de autoconhecimento que existem. Como tal, engloba todos os aspectos relacionados ao ser humano -- da saúde física ao intelecto, passando pelas emoções, a espiritualidade e outras energias e movimentos mais ou menos sutis que influenciam nossas vidas. Em razão disso, o yoga originou diversas linhas e métodos, cada um buscando oferecer ensinamentos mais adequados às necessidades dos praticantes, cada um enfatizando um ou mais aspectos da prática do yoga, como a meditação ou os exercícios respiratórios.
A linha mais conhecida e divulgada atualmente é o Hatha Yoga. Quase todas as linhas e métodos oferecidos atualmente são variações do Hatha Yoga. Sua principal característica é a ênfase dada à prática física como meio de atingir os objetivos do yoga -- autoconhecimento e união com Deus. Seria o yoga, então, uma espécie ginástica meditativa? Uma musculação religiosa? Contorcionismo para pessoas espiritualizadas? Qual a relação entre posturas exóticas e os objetivos finais do yoga?
A melhor resposta é: nenhuma -- simplesmente não há relação necessária entre a prática física, o autoconhecimento e a união com Deus. Não se tem notícia de que nenhum sábio ou santo praticasse exercícios físicos ou yoga. Apesar disso, são inegáveis os benefícios físicos desta prática e o autoconhecimento passa pelo conhecimento do próprio corpo. Neste sentido, as posturas, os exercícios respiratórios, além de outras práticas físicas do yoga, podem trazer benefícios importantes para qualquer pessoa e, de fato, a prática física do yoga pode normalizar o peso do praticante, reforçar músculos e articulações, melhorar a respiração, a qualidade do sono e a disposição física geral, entre muitos outros benefícios.
Estes benefícios não tornam um homem sábio ou santo, mas ajudam no processo de autoconhecimento -- e isto, sim, faz parte da sabedoria e da santidade. Em outras palavras, quero dizer que o yoga tem vários recursos e meios que podem, de fato, tornar uma pessoa melhor sob diversos aspectos.
Hoje, mais do que nunca, sabe-se que os males físicos, mentais e emocionais estão fortemente relacionados aos nossos hábitos. Não apenas o que comemos, mas também o que fazemos, pensamos e sentimos são fatores determinantes para nossa saúde. O yoga não obriga a isto ou aquilo, não exige que se adote este ou aquele hábito, mas promove a plena saúde física, mental e emocional à medida que nos torna mais conscientes e autoconscientes. Não se trata de uma "consciência em cápsulas", mas de algo pleno e genuíno que, uma vez conquistado, não se perde nunca.
Para o praticante de yoga, unir-se com Deus não significa recolher-se num mosteiro e permanecer em meditação até o fim da vida. Unir-se com Deus, através da prática do yoga, significa encontrar em si mesmo e em todos os seres a natureza divina.
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Artigo publicado originalmente no site Luz e Terra. Link da imagem.
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